o espetáculo do exagero

Camila Naomi
1 min readApr 21, 2023

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Pior que o amargor é a intenção do amargo. Criar entre veias e artérias um condensado e denso líquido na necessidade virtuosa de criar tudo além do que verdadeiramente já o é. A excentricidade de comover-se com o vento que balança as folhas com um desdém perfeito, uma agonia exuberante. O brilho do sol que neste momento eterniza essas palavras e irradiam unicamente sobre mim, dentro de mim, para mim.

Dotada pelo desprivilegio da poesia e com o ardor da indiferença da consciência e da consistência; que transforma tudo tocável em um encantador e imortal tédio. A penumbra da arte desvanecendo dos meus dedos com o talento nobre de transformar sentimentos em palavras que não dizem nada.

Ser um atento e dolorido exagero. Provocar mágoa para sentir mágoa. Mentir para saber o que é mentira. Enganar-se para saber enganar. Refazer e desfazer toda uma existência, para no sonho ser a fantasia que falta na ambição de viver. Ser um estátua comprida e perpétua de invenção. Todo poeta que é e que crê ser é na verdade um desonesto frígido. Incapacitado de vida. Motivado pela culpa de não sentir com as trivialidades da vida que preenchem os dias de amor e tédio, se flagela pelo fado próprio de tornar tudo muito grande, muito alto, muito mortal, muito exagero; coisa demais. Um grande e fascinante delírio.

“O que sinto é sentido para se escrever o que sentiu”

-Fernando Pessoa, ‘Livro do Desassossego’

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